Lewinsky revela preocupação com "a maneira como alimentamos as chamas da misoginia"
ANGELO CORDEIRO | @ANGELOCINEFILO Publicado em 01/06/2022, às 18h00
Monica Lewinsky, ativista, autora e personalidade televisiva americana, deixou claro estar descontente com os rumos que o julgamento do caso Johnny Depp e Amber Heard tomou. A ex-estagiária da Casa Branca, que se envolveu em uma polêmica com o ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton, afirmou em um artigo de opinião para a revista Vanity Fair que o "espetáculo seria triste o suficiente se apenas impactasse a vida pessoal de Depp, Heard e seus entes queridos."
"Seria triste o suficiente, mesmo se apenas considerássemos como isso afetou sobreviventes de violência doméstica ou aquelas que buscaram força no movimento #MeToo. No entanto, são as implicações para nossa cultura que mais me preocupam: as maneiras como alimentamos as chamas da misoginia e, separadamente, o circo das celebridades", acrescentou Lewinsky no artigo, publicado nesta terça-feira (1).
Ela continuou dizendo que a facilidade de assistir ao julgamento, por meio de streaming, faz muitos "pensarem, inconscientemente, que temos o direito de olhar e assistir. De julgar. De comentar. (...) E acabamos com esse cruzamento cultural confuso de assistir duas pessoas (que estamos acostumados a ver como atores atuando em uma tela) em um cenário – um tribunal – onde normalmente esperaríamos que eles assumissem os papéis de seus personagens"
Lewinsky continuou, referindo-se à natureza aparentemente viciante do julgamento como "pornô de tribunal" e traçando paralelos com o romance distópico de ficção científica, "Admirável Mundo Novo".
Ela também relembrou de sua própria controvérsia no passado brincando - "Google: 1998" - e refletiu que ela "não estava surpresa que os memes” que ela viu sobre Heard “superassem em muito aqueles sobre” Depp."Não fiquei surpresa que o discurso cruel e cáustico fosse predominantemente voltado para a mulher", acrescentou. "E eu não deveria ter ficado surpresa (mas fiquei) que logo após minha busca, comecei a receber sugestões de posts sobre o julgamento."
"Mas eles eram menos sobre Depp e Heard; mais pareciam idolatrar Camille Vasquez (advogada de Depp) por sua 'performance' interrogando Heard. (Oh, você pensou que não teríamos nenhuma richa de garota contra garota neste julgamento? Isso está no álbum de maiores sucessos de Misogyny", ironizou Lewinsky.
Ela também discutiu o conceito de direito quando se trata de opiniões sobre depoimentos no julgamento e como a crueldade entra em jogo no tratamento geral dos envolvidos, fazendo comparações com sua própria situação.
"No final, as maneiras como desdenhosamente cooptamos o julgamento para nossos próprios propósitos são um sinal de quantos de nós, os mestiços da mídia social, continuamos a desvalorizar nossa dignidade e humanidade. (Desculpe-me se eu subi no meu cavalo por um parágrafo ou dois. Tendo sido alvo desse tipo de crueldade, posso dizer que as cicatrizes nunca desaparecem.)"
Lewinsky terminou seu artigo opinando que "estamos encharcados da sujeira e da agressão das guerras nas mídias sociais. A conversa obsessiva em torno do julgamento de Depp-Heard é apenas um pequeno exemplo da busca pela felicidade e excitação com a desgraça alheia", acrescentando: "Não importa a quem o veredito do júri favoreça - seja o réu Heard ou o demandante Depp - nós somos culpados".
O VEREDITO
Após sete semanas de depoimentos e deliberações de quase quatro dias, o corpo do júri, formado por sete pessoas, cuja identidade deve ser preservada por um ano, anunciou nesta terça-feira (1º) o veredito do caso envolvendo os atores e ex-casal Johnny Depp e Amber Heard.
O astro de "Piratas do Caribe" pedia US$ 50 milhões por danos, devido a um artigo de Amber Heard sobre violência doméstica publicado no "Washington Post" em 2018, afirmando que teria sido difamado pela ex-esposa. Por vencer o processo, Depp receberá US$ 15 milhões de Heard.
Já a atriz de "Aquaman" pedia o dobro (US$ 100 milhões) por declarações de um ex-advogado de Depp chamando seu relato de "farsa". Cada um dos atores declarava ter sido abusado durante o período em que estiveram juntos.
Johnny Depp não estava presente no tribunal e assistiu à decisão por vídeo, da Inglaterra, onde se encontra para fazer um show com Jeff Beck. Amber Heard presenciou a decisão no tribunal.
O julgamento por difamação foi transmitido ao vivo pela internet entre 11 de abril e o último dia 27, o que gerou grande repercussão pela relação conturbada vivida pelos dois enquanto formavam um casal. Nas redes sociais, as hashtags "#JusticeForJohnnyDepp" ("Justiça para Johnny Depp") e "#JusticeForAmberHeard" ("Justiça para Amber Heard") estiveram entre os assuntos mais comentados durante todo o período.
ENTENDA O CASO
Johnny Depp, 58 anos, e Amber Heard, 36 anos, começaram a se relacionar em 2011 após contracenarem juntos no longa "Diário de um Jornalista Bêbado". Eles se casaram em 2015 e, dois anos depois, concluíram o divórcio.
Ao longo de sete semanas, o júri ouviu uma série de depoimentos, gravações de brigas do ex-casal. Em um dos casos, Depp afirmou que teria tido a ponta de seu dedo cortada após ser atingido por uma garrafa de vodka jogada pela então esposa.
Heard negou a acusação, afirmando que Depp a agrediu sexualmente naquela noite com uma garrafa de bebida, que ela não tinha certeza se estava quebrada ou não. Em outro caso, a atriz admitiu que agrediu o ex-marido com receio do que ele pudesse fazer contra a irmã dela.
Em diversas ocasiões, Depp negou ter batido em Heard ou em qualquer mulher e disse que foi ela quem se tornou violenta em seu relacionamento. Ele disse que as alegações de Heard lhe custaram "tudo". O ator perdeu o papel de Capitão Jack Sparrow em um novo filme de "Piratas do Caribe" - embora ele tenha dito que jamais voltaria a interpretar o personagem - e foi substituído na franquia de filmes "Animais Fantásticos", spin-off de "Harry Potter", pelo ator Mads Mikkelsen.
Há menos de dois anos, Depp perdeu um caso de difamação contra o jornal britânico "The Sun", que o rotulou como "espancador de esposas". Um juiz da Suprema Corte de Londres decidiu que ele havia agredido Heard repetidamente. Os advogados de Depp entraram com o caso no estado da Virgínia desta vez, por ser o local de impressão do "Washington Post", ainda que o jornal não seja réu.
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