Filme prova ser irresponsável quando uma plateia ri de uma piada tosca com minorias logo após um assassinato frio
Atenção: o texto a seguir contém spoilers sobre o filme Coringa.
No mundo fictício em que o novo filme Coringa, que chega aos cinemas na próxima quinta-feira (3), se ambienta, a cidade de Gotham está em caos. Abandonada pelo poder público, uma greve deixa a cidade entregue a ratos gigantes e à violência.
Falta emprego, falta segurança, falta empatia. É Gotham, na ficção, mas poderia ser qualquer lugar do mundo, na realidade, em 2019. E é aí onde mora o perigo do filme.
Tudo que tem se falado sobre Coringa incitar a violência é verdade. O discurso vendido no longa de Todd Phillips é de ir contra o sistema, se rebelar. Tumultos e protestos violentos na ficção podem se tornar realidade. Assassinatos a sangue frio são comemorados no filme e podem correr o risco de serem aplaudidos também do lado de fora das telonas.
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Não é alarmismo e o problema não é o incrível Coringa/Arthur Fleck, vivido impecavelmente por Joaquin Phoenix, que merece todos os prêmios de atuação que puder concorrer. É tudo que está ao redor dele. O Coringa é o mais famosos, mais temido e mais louco vilão do Batman. É esperado que ele cometa insanidades, sem escrúpulos ou remorso. O que não se espera é que suas maldades e transgressões sejam aplaudidas, dentro e fora das telas.
Sabe a expressão “bater palma para maluco dançar”? É literalmente o que acontece em Coringa, com o perdão do pequeno spoiler. Ele mata poderosos, as pessoas se sentem representadas e começam a celebrar o palhaço, que vira um símbolo de “resistência” tal qual a máscara de Dalí em La Casa de Papel. É perigosos e irresponsável.
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Alguém pode alegar que a mentalidade violenta dos moradores de Gotham não corresponde à da humanidade em 2019, mas a prova de que o nosso mundo é o mesmo da ficção veio na sessão para a imprensa do filme, da qual participou a Exitoína Brasil. Sem muitos spoilers, há no longa um assassinato a sangue frio e, logo em seguida, uma situação em que um anão sofre para alcançar um objeto. A cena é pesada, beira o gore, mas muitas pessoas gargalham com o anão. Sim, em pleno 2019 o filme não só faz piada com anões como pessoas ainda riem dela.
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Phillips rebate toda e qualquer crítica ao seu longa que diga que ele incita a violência. Bem, em determinado momento, o Coringa confronta o apresentador de TV Murray Franklin (Robert De Niro) e diz que pessoas ricas, como ele, não o enxergam, não se colocam no lugar do povo. Talvez, o senhor Phillips também esteja preso em seu mundo e não consiga enxergar os alarmantes paralelos entre a sua ficção e a realidade.
O filme é tão problemático que é até difícil curtir as partes boas quando elas aparecem, como a relação de Arthur com Thomas (Brett Cullen) e Bruce Wayne (Dante Pereira-Olson), a trama envolvendo sua mãe (Frances Conroy) e as cenas no Asilo Arkham, a famosa instituição de saúde mental de Gotham.
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Por falar em Thomas Wayne, ele é parte fundamental da narrativa.
E, aqui, é necessário um grande spoiler. Se não quiser ser surpreendido, pare de ler por aqui.
Candidato a prefeito de Gotham, ele se torna uma das figuras mais odiadas da cidade ao dizer, publicamente, que as pessoas revoltadas realmente se sentem como palhaços. É o seu comentário que gera a grande onda de protestos violentos e que culmina com a sua morte e a de sua esposa, Martha, em frente ao filho Bruce. Sim, a clássica cena da morte dos pais do Batman é novamente encenada nas telonas.
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O problema nesta nova cena é que o contexto muda totalmente. Bruce Wayne se torna o Batman para combater a criminalidade que matou seus pais quando criança. Em Coringa, porém, Thomas Wayne foi morto por ser, ele, um dos grandes responsáveis pelo caos em Gotham. Como fica, então, a motivação de Bruce? É importante renovar franquias antigas, mas é importante também que as mudanças nas histórias sejam bem-feitas.