Dirigido e roteirizado por Marielle Heller, o filme entrou no catálogo do Disney+ nesta sexta-feira (24), sem custos adicionais para os assinantes
Publicado em 24/01/2025, às 20h00
Apontado no início de 2024 como forte candidato a levar Amy Adams (A Chegada) para o Oscar - mais uma vez - Canina termina estreando diretamente no streaming (Disney+), frustrando muitos fãs da atriz, que todo ano sonham vê-la levando a tão almejada estatueta do careca dourado. Tendo isso em vista, é possível afirmar que o novo filme da diretora Marielle Heller (Um Lindo Dia na Vizinhança) é tão decepcionante quanto o que aconteceu com a expectativa criada pelos fãs.
Canina se destaca inicialmente pela proposta ousada de mesclar comédia, drama e elementos fantásticos, especialmente ao explorar a transformação da protagonista em uma figura canina. Na história, Amy Adams é uma artista que abandona sua carreira para se dedicar integralmente ao cuidado de seu filho recém-nascido. Com o tempo, a pressão dessa nova rotina começa a impactar sua sanidade, levando-a a acreditar que está se transformando em um cachorro.
Se os fãs vão se frustrar com o fato de que Amy Adams não irá conseguir nada na temporada de prêmios, pelo menos eles não terão o que reclamar da performance da atriz, que é o grande trunfo do filme. Sua performance equilibrada entre a entrega corporal e sua habilidade em incorporar tanto os aspectos internos quanto externos da personagem contribuem para um estudo de personagem interessante até a primeira página. No entanto, à medida que o filme avança, o que parecia uma história intrigante, logo se revela uma abordagem básica sobre ser mãe.
O roteiro é raso e peca pelo óbvio, parecendo que estamos assistindo à dramatização de um livro de auto-ajuda para mães de primeira viagem em sobrecarga que estão prestes a sofrer um burnout. O que poderia ser uma reflexão mais profunda sobre os desafios da maternidade, da identidade e da auto aceitação acaba se tornando um discurso superficial e excessivamente explicativo. Faz falta uma roteirista como Diablo Cody, que escreveu o excelente Tully (2018), que trata basicamente dos mesmos temas de Canina.
A falta de uma abordagem mais ousada e criativa para uma história curiosa por si só resulta em uma direção bastante tradicional. Em vez de usar o surreal e o real para criar tensão ou reflexão, Marielle Heller acaba caindo em uma zona de conforto que não faz jus à proposta mais audaciosa que Canina inicialmente parecia ter. Há um desequilíbrio entre as partes. Enquanto aposta no drama, a premissa caminha bem, embora óbvia, quando decide rumar para o fantástico - nas cenas em que Adams sofre sua transformação -, a montagem contribui para uma sensação de que o filme não consegue estabelecer uma fluidez natural.
Com isso, a tentativa de equilibrar o lúdico e o dramático é prejudicada por uma montagem que mais interrompe a experiência do que complementa a história. Isso reflete a falha em integrar os dois mundos de forma orgânica, deixando o filme com uma sensação de descompasso entre suas principais camadas, enquanto Amy Adams, sozinha, tenta salvar a bagunça que Canina vai virando.
Por fim, Canina até apresenta uma premissa interessante e uma interpretação notável de Amy Adams, mas que se perde nas escolhas estilísticas e narrativas. A mistura de elementos fantásticos com o drama psicológico e familiar é uma ideia que poderia fazer com que o filme tivesse mais sucesso na temporada de premiações, mas a execução carece de uma coesão que permita que esses elementos realmente se fundam de maneira impactante. Não à toa, foi ignorado dos prêmios.
Ao optar por um caminho mais literal, sem saber o que fazer com o surreal, Marielle Heller abdica da potência que sua premissa absurda poderia ter. Assim, o que começa como uma reflexão intrigante sobre identidade e maternidade se transforma em um discurso simplificado, sem o vigor necessário para se destacar como uma obra memorável.
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