Novo capítulo da trilogia "X", criada por Ti West e estrelada por Mia Goth, chega aos cinemas brasileiros a partir desta quinta-feira (4)
ANGELO CORDEIRO | @ANGELOCINEFILO Publicado em 03/07/2024, às 18h00 - Atualizado em 04/07/2024, às 10h00
Quando Ti West lançou "X - A Marca da Morte", em 2022, ninguém imaginou que aquele seria o início de uma trilogia de sucesso, que viralizaria nas redes sociais devido à protagonista vivida por Mia Goth. Além de talentosa, a atriz trazia uma ligação especial com o Brasil: é neta da atriz brasileira Maria Gladys, o que rapidamente se tornou motivo de exaltação.
No filme, Goth vive a jovem e bela Maxine e também a idosa Pearl, dona da fazenda aonde uma trupe de atores vai para gravar uma fita pornô e que, meses depois, no mesmo ano, viu a sua história ganhar as telonas. Na prequela de "X - A Marca da Morte", somos apresentados à juventude e o início da psicopatia da personagem-título, que tem o sonho de se tornar uma estrela do cinema.
Com o sucesso das produções, crítica e público abraçaram Mia Goth e suas Maxine e Pearl. A atriz, que já havia estrelados outras obras - saiba onde assisti-las aqui -, nunca fora tão exaltada em sua carreira como então. Viralizou de vez, virando até estampa de camiseta e tema de festa à fantasia.
Por isso, criou-se uma grande expectativa para a estreia de "MaXXXine", prometido por Ti West como o encerramento da trilogia "X", como alguns a chamam, apesar de não ter um título oficial. No entanto, o cinema é ingrato com expectativas, para o mal e para o bem. Filmes são o que são, e o que esperamos deles é problema nosso.
A sessão de "MaXXXine" para a imprensa fugiu do comum logo de cara: aconteceu à noite, quando normalmente são realizadas pela manhã. Várias salas do complexo Cinesystem - antigo Itaú Cinemas -, no Shopping Frei Caneca, em São Paulo, estavam preparadas para exibir um dos filmes mais aguardados do ano. Ao final da projeção, olhei para meu amigo ao lado e a frustração estava estampada no rosto de ambos. Afinal, o que aconteceu?
Lembro bem da primeira vez em que assisti a "X - A Marca da Morte" e recordo de ter gostado bastante da forma com que Ti West faz sua própria homenagem aos slashers dos anos 70. É o tipo de trama que não se baseia em referências, apesar de elas estarem ali, e de tão sutis que são, não interferem em nada no andamento da história. Aquele meme do DiCaprio assobiando e apontando para a tela a cada 5 ou 10 minutos não acontece por aqui. O clima setentista é o carro-chefe do longa, tal qual o sexo e as mortes brutais.
Aí veio “Pearl”, outra fita inesperada, agora com outro tipo de abordagem, investido em um design de época do início do século passado, embora contraventor por ser mais pitoresco em comparação aos filmes da época em que o código Hays ainda valia em Hollywood, mas também com sexo e mortes brutais como essência.
A personagem de Mia Goth tem sua sexualidade reprimida, “transa” com um espantalho, se joga para cima do projetista do cinema, e apela para a violência em momentos em que é contrariada. Ela não estava preparada para o moralismo daquela época.
Uma coisa que se vê tanto em “X - A Marca da Morte” quanto em “Pearl” é como o puritanismo, o moralismo e o conservadorismo da sociedade eram dominantes e, em consequência disso, Maxine e Pearl são peças fundamentais em seus tempos e em seus filmes para se contrapor a tais aspectos.
O sexo como ferramenta de trabalho e manifestação artística em “X - A Marca da Morte” e a dança e o desejo como fuga da realidade em “Pearl” deveriam se amalgamar da mesma forma em “MaXXXine”, mas essa ideia morre na praia no último capítulo da trilogia.
É muito estranho como a sequência destoa completamente de seus antecessores. Se por um lado fica clara a intenção de referenciar o giallo (as luvas pretas, os assassinatos misteriosos, etc.), por outro lado, o filme se perde em um mar de referências, que acabam tirando força daquilo que a franquia sempre teve de melhor: sua protagonista.
Mia Goth se esforça e domina Maxine muito bem. Quando ela está sozinha em cena, o filme tem potência. No entanto, quando ela contracena com os demais personagens dessa nova história, a coisa descamba.
Kevin Bacon ("O Mundo Depois de Nós") até tem um personagem interessante, mas que logo ruma para o ridículo. Elizabeth Debicki ("Guardiões da Galáxia: Volume 3") é a diretora do filme para o qual Maxine Minx é escalada. Francamente? Poderia ser qualquer atriz ali que não faria diferença. E o cantor Moses Sumney ganha algumas falas e minutos de tela, mas não demora muito para ter seu destino traçado.
A dupla de detetives vivida por Michelle Monaghan ("Plano em Família") e Bobby Cannavale ("Bem-Vindos à Vizinhança") nos tira o riso na primeira piadinha, que é repetida mais algumas vezes, mas sem o mesmo frescor. E Halsey e Lily Collins ("Emily em Paris")? Aparecem, somem e não fazem falta. Até mesmo o excelente Giancarlo Esposito ("Caleidoscópio") está em um papel indigno de seu talento.
No meio disso tudo está a Maxine de Mia Goth, que incrivelmente não consegue se destacar no meio dessa bagunça. A personagem está muito aquém do que Pearl fora em seu filme homônimo e do que a própria Maxine já apresentara em “X - A Marca da Morte”.
Para um giallo - usarei esse subgênero do terror como a maior referência do roteiro -, “MaXXXine” se apropria muito pouco dos elementos do estilo, brincando timidamente com eles. É uma dose genérica do potencial que já nos fora apresentado antes.
Mas Ti West não está contente em se limitar a uma referência só. Até filme de seita “MaXXXine” tenta ser. Nesse momento, inclusive, a história anuncia a tragédia para a qual descambaria, num terceiro ato revelador de um plot twist que, se não for previsível para alguns, deixa estampada a mediocridade de ideias do roteiro. Se o cineasta afirma ter usado “Hardcore - No Submundo do Sexo”, de 1979, um filmaço de Paul Schrader, como referência para esse subtexto, essa é mais uma coisa que ficou somente na intenção.
Existem muitos problemas em “MaXXXine”: quer ser demais e acaba não dando conta de quase nada; a protagonista que não conduz a narrativa, mas é levada por ela; os coadjuvantes descartáveis; e o sexo, tão presente nos filmes anteriores, aqui é nulo. Mas talvez o maior de todos os problemas seja a forma com que o vilão se materializa, o tal Night Stalker, uma referência ao serial killer que realmente existiu e foi responsável pela morte de 13 pessoas nos anos 1980 em Los Angeles e São Francisco.
Vale uma comparação? Em “Maligno”, James Wan consegue homenagear e brincar com o giallo ao apresentar um assassino que realmente nos angustia e apavora, ainda que saibamos que é tudo ficção. Já Ti West passa longe de causar o mesmo efeito em sua história com um assassino inspirado em alguém que realmente existiu! Seus assassinatos chegam sem alarde ou impacto. É um filme que precisa de vilão, mas quando ele é revelado, torna-se patético.
Em suma, “MaXXXine” é um filme sem personalidade e sem coragem. Para alguns, é a tal “maldição do terceiro filme”, que já vimos acontecer com “Homem-Aranha 3”, “Homem de Ferro 3”, “X-Men: O Confronto Final”, “Pânico 3”, “Matrix Revolutions” e tantos outros. A lista é imensa.
Em seu capítulo final, “MaXXXine” perdeu o que “Pearl” e “X - A Marca da Morte” tinham de melhor: o tesão. O que sobrou foi a frustração do que a produção poderia ter sido e a sensação de que Ti West se rendeu ao puritanismo que tanto combateu anteriormente. Infelizmente, essa estrela não brilhou.
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