Longa de Alejandro Hidalgo estreia nos cinemas nesta quinta-feira (10)
Algumas obras acabam se tornando a maior referência quando falamos de certos gêneros, temas e estilos. Falou em dinossauros, lembramos de “Jurassic Park”; quando o assunto são os filmes de animais assassinos gigantes, é “Tubarão” que vem à nossa mente; nos tempos atuais "John Wick" é o modelo para a ação; e “O Exorcista”, um dos principais expoentes do terror, é carta marcada quando o assunto são os filmes de exorcismo.
Alejandro Hidalgo, diretor de "La Casa del Fin de los Tiempos", o primeiro filme de terror da Venezuela, tem consciência disso e, em certa cena de “Exorcismo Sagrado”, faz uma referência direta ao clássico de William Friedkin copiando descaradamente a icônica cena do pôster com o padre em frente à casa - em um momento que fará com que muitos fãs de cinema repitam o gesto de Leonardo DiCaprio em “Era Uma Vez em… Hollywood”, quando seu personagem se vê em um filme e aponta para a tela.
Ao ver tal imagem, automaticamente, o espectador pode pensar: lá vem mais uma história de exorcismo que vai sobreviver de referências aos clássicos. Então, como manter a curiosidade da audiência aguçada? Ora, se vários e vários filmes sobre exorcismo tentaram ser levados a sério e caíram no esquecimento, por que não tentar algo diferente? Hidalgo arrisca. E, sabendo de sua limitação orçamentária - que fica evidente quando o CGI se faz necessário - e sem querer ser apenas mais um filme sobre exorcismo, ele nada contra a maré de um gênero saturado e se assume como campy, sem deixar de ser coeso, fazendo da experiência que é assistir ao seu filme algo bastante agradável e até divertido.
Apesar de uma trama que inicia sem muita originalidade, “Exorcismo Sagrado” caminha a passos largos de mãos dadas com o exagero, criando alguns momentos que remetem a um novelão mexicano - com direito a uma filha bastarda. Na história, o padre Peter Williams (Will Beinbrink) tenta salvar uma jovem possuída em um perigoso ritual de exorcismo. Quando as coisas parecem ter dado certo, ele comete um terrível sacrilégio. Dezoito anos depois, agora considerado um santo pelos locais por ter salvado a jovem, as consequências do pecado cometido pelo padre irão atormentá-lo.
Recentemente, Paul Verhoeven chocou os cristãos com “Benedetta”, no qual uma freira passa a se relacionar amorosa e sexualmente com outra noviça, lá, as cenas quentes e provocantes de sexo entre ambas funcionam como uma reação daquelas mulheres à opressão da Igreja. Ao contrário do cineasta holandês, o venezuelano Hidalgo usa o sexo em “Exorcismo Sagrado” não como um artifício de reação, mas sim como algo a ser condenado - ainda mais se praticado por alguém considerado santo. Assim, seu filme leva em consideração que os dogmas da Igreja são sagrados e que desrespeitá-los trará consequências. E quem pune não é Deus.
Isso coloca o padre Peter no centro da história como um objeto de desejo por parte do mal ao mesmo tempo que é respeitado por aqueles que frequentam sua paróquia. Quando é chamado para ajudar a uma outra jovem possuída, o padre se vê sem poder algum sobre o demônio, que passa a persegui-lo e a fazer escárnio de sua santidade. O título original - “O Exorcismo de Deus”, em tradução livre - revela como “Exorcismo Sagrado” quer fugir da mesmice dos filmes de exorcismo, tornando o padre aquele que deve ser exorcizado. Não é à toa que o final lança olhos para o fim de outro terror icônico - que eu não vou revelar qual é para evitar spoilers.
Em suma, “Exorcismo Sagrado” aposta primordialmente em duas coisas para envolver o espectador: a principal delas é o poder das imagens. O filme se apropria do que é santo e sagrado para aterrorizar - a exemplo de um Cristo possuído que é mais assustador que muitas imagens do próprio diabo que já vimos por aí. E também indo em busca de um diferencial dentro do gênero, usando e abusando das ótimas tiradas do padre vivido por Joseph Marcell - ele mesmo, o mordomo Geoffrey de “Um Maluco no Pedaço” - personagem que, graças ao seu humor ácido, deixa claro que o filme não quer ser levado a sério - sem recusar, é claro, alguns bons sustos.